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Empregada Gestante

  • Foto do escritor: Toledo Niess Advocacia e Consultoria Jurídica
    Toledo Niess Advocacia e Consultoria Jurídica
  • 22 de jun. de 2020
  • 7 min de leitura

O legislador ao proteger a empregada gestante, procurou atingir duas finalidades precípuas: por um lado, proteger o trabalho da mulher, e de outro, um objetivo social maior, qual seja a defesa da família e da maternidade.


O conceito de empregado foi fixado pelo legislador no art. 3º da Consolidação das Leis do Trabalho, nos seguintes termos: “Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário.”


Pelo exame do texto legal, verificamos que a CLT exige taxativamente a ocorrência de vários requisitos para a caracterização do empregado: a) serviços prestados sob dependência; b) mediante pagamento de salário; c) de caráter permanente. A dependência é a jurídica, vale dizer, a subordinação hierárquica do trabalhador consistente no cumprimento das ordens legítimas emanadas do empregador ou de seus prepostos. O pagamento de salário decorre da própria natureza do contrato de trabalho, que sendo um acordo de vontades bilateral e oneroso, em contraprestação aos serviços prestados, obriga o empregador a fazer o pagamento da remuneração convencionada. O caráter de permanência também é oriundo da própria natureza do contrato, que é um contrato de duração, e, mais especificamente, de execução continuada (i.é, contrato que se executa mediante prestação única, mas ininterrupta).


O conceito se estende à empregada gestante, vez que o Parágrafo Único do citado art. 3º estabelece que “Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual”.


Caracterizada a empregada, resta-nos conceituar a gestação.


Gestação no sentido técnico fisiológico indica o tempo de desenvolvimento do embrião no útero materno, desde sua concepção até o momento do nascimento. PINARD, citado por ALMEIDA JR e J.B. DE O. e COSTA JR., define de forma objetiva a gestação como o “período durante o qual a mulher conserva dentro de si, e alimenta, o produto da concepção” (Lições de Medicina Legal, 9ª ed., S.P., Ed. Nacional, l971, p.337).


Quanto à duração da gravidez, nosso Código Civil (art. 338) estabelece uma presunção legal absoluta, tanto quanto ao mínimo de 180 dias (com feto viável), como quanto ao máximo de 300 dias.


Clinicamente aproveitando a lição de ODON RAMOS MARANHÃO, “os autores estão de acordo na existência de uma dificuldade de determinação precisa do início da gravidez. Não quanto ao fato biológico, mas quanto à sua datação. P.ex.: se uma pessoa é dada à prática sexual seguida, torna-se quase impossível saber qual dos contatos foi o fecundante. Quanto ao final do ciclo gravídico, também há variabilidade entre as primíparas e as multíparas e das que levam vida sedentária às que se entregam a excessivo labor até o período do parto. Há, contudo, uma duração média usual. Tem-se calculado esse período em 270 a 280 dias (dez meses lunares ou nove meses solares). Essas cifras têm sido aceitas pela maioria dos autores”. (Manual de Sexologia Médico-Legal, S.P., Revista dos Tribunais, 1972, p. 45-6). No mesmo sentido ALMEIDA JR e COSTA J.B. DE O. e COSTA JR., que ainda esclarecem que existem gestações prolongadas, durando mais de 300 dias. “Excluindo com Thoinot, os casos apócrifos e os mentirosos, ainda restam os reais, que vão até 320 a 330 e mesmo 340 dias” (Op. Cit., p. 361). Quanto à duração mínima, os recém-nascidos de menos de 27 semanas (189 dias) raramente tinham condição de vida autônoma, mas em razão dos progressos científicos dirigidos à assistência aos imaturos, a duração mínima vem sendo diminuída.


A legislação trabalhista, em virtude do duplo fator de proteção (mulher e gestação), dentro da proteção especial do trabalho da mulher (em razão de suas diferenças somáticas), dá uma proteção especialíssima à empregada gestante (CLT, arts. 391 a 395). Protegendo-se a futura mãe, estará se protegendo o futuro trabalhador e auxiliando-a a cumprir a missão mais sublime e mais nobre de todas: a de ser mãe, obedecendo assim aos preceitos bíblicos do crescei e multiplicai-vos.


SEGADAS VIANNA, indagando a respeito dos antecedentes históricos do trabalho da mulher, expressa-se nestes termos: “Desde que o homem trabalhou tem a ajuda da mulher; e talvez, segundo a narração bíblica, teria recebido a obrigação de trabalhar por causa da mulher... Companheira do homem nos momentos de alegria e de tristeza, nas horas do descanso e do trabalho, era para os romanos consortium omnis vitae e para os germanos, segundo Tácito, laborium pericudorunque socia”. (Instituições de Direito do Trabalho, Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1977, v.2,p.203).


Mas, a mulher, que na verdade sempre foi segregada às funções do lar durante séculos, de repente é chamada pelo desenvolvimento industrial a contribuir com sua mão de obra. O capitalismo, por sua vez, aproveitou-se do afluxo das mulheres às fábricas, reduzindo os salários e aumentando as horas de trabalho. De outro lado, fatores de ordem privada impeliram a mulher a dividir o seu tempo entre as tarefas do lar e o trabalho remunerado.


Assim, a mulher, ou para colaborar com o marido nos encargos da sociedade conjugal, ou por se ver abandonada pela sorte (invalidez do marido para o trabalho, abandono do lar, viuvez), precisou trabalhar para ganhar o seu sustento e grávida também o do filho que carrega no ventre.


A proteção à empregada gestante já era objeto de preocupação dos legisladores constituintes quase um lustro antes da promulgação da CLT. Teve início com a Constituição de 1934 (art. 121, § 1º, h), seguida das Constituições de 1946 (art. 157, X), de 1967, bem como na redação da Emenda n.1 de 1969, garantindo sempre à gestante o emprego e o direito ao repouso remunerado antes e depois do parto. Entretanto tais Constituições não mencionavam o período de afastamento, que era de 84 dias, fixado pelo art. 392 da CLT (“É proibido o trabalho da mulher grávida no período de 4 (quatro) semanas antes e 8 (oito) semanas depois do parto”), artigo este que por se contrapor à nova Constituição, restou modificado.


Com efeito, a Constituição Federal de 1988, consignou expressamente que o período de garantia do emprego e salário da gestante tem a duração de cento e vinte dias (art. 7º, XVIII).


Também passa a merecer disciplina constitucional a denominada estabilidade provisória da gestante (ou seja, a garantia de emprego da empregada gestante), estabilidade esta cuja evolução doutrinária, jurisprudencial e resultante das normas oriundas das convenções coletivas, já vinha se antecipando ao legislador constituinte e ordinário. Assim, o art. 10, inciso II, letra “b” do ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS, concede a garantia de emprego desde a confirmação da gravidez, até cinco meses após o parto, ficando neste período vedada a dispensa arbitrária ou sem justa causa. Nossos Tribunais reconhecem à gestante despedida injustamente o direito aos salários de todo o período da gravidez, do salário-maternidade correspondente aos 120 dias de afastamento legal bem como da estabilidade provisória, inibindo desta forma as frequentes dispensas de empregadas grávidas.


Ressalta-se que a Lei n.º 11.770/08 instituiu o programa Empresa Cidadã, que prorroga para 180 dias a duração da licença mediante concessão de incentivo fiscal às pessoas jurídicas que aderirem ao programa.


Existe atualmente uma proposta de emenda constitucional – PEC 158/19 a qual amplia o prazo do benefício para seis meses independentemente da adesão da empresa ao programa supracitado, com base na importância da amamentação nos primeiros meses de vida da criança.


Esmera-se ainda a Consolidação das Leis do Trabalho em defender a integridade orgânica e moral da empregada gestante, encabeçando o elenco das disposições pertinentes o art. 391 que estabelece não constituir motivo justo para a rescisão do contrato de trabalho o fato de a mulher haver contraído matrimônio ou encontrar-se em estado de gravidez. À convolação de núpcias é decorrência natural a gravidez da mulher, sendo, pois, manifesto que os estados de casada e/ou gravidez não podem autorizar a despedida sem indenização.


Por outro lado, pode a empregada gestante resolver o contrato de trabalho, mediante atestado médico, desde que lhe seja prejudicial à gestação (CLT, art. 394), tendo nestas condições um justo motivo e ficando, portanto, dispensada de dar aviso prévio ao empregador.


Em casos excepcionais o período de afastamento legal de 120 dias poderá ser aumentado por mais duas semanas antes e mais duas semanas após o parto (CLT., art. 392, § 2º).

O Supremo Tribunal Federal, na Sessão Virtual que se encerrou no dia 2 de abril de 2020, referendou, por maioria, a medida cautelar deferida pelo ministro Edson Fachin na ADI 6327, a necessidade de prorrogar o benefício, bem como considerar como termo inicial da licença-maternidade e do respectivo salário-maternidade a alta hospitalar do recém-nascido e/ou de sua mãe, o que ocorrer por último, quando o período de internação exceder as duas semanas previstas no art. 392, § 2º, da CLT, e no art. 93, § 3º, do Decreto nº 3.048/99”.


Tal afastamento (licença) concedido à empregada gestante tem caráter compulsório (v.g., os termos da lei : “É proibido o trabalho da mulher grávida no período ...”).

Para que a empregada gestante goze do benefício (licença), deve preencher um requisito essencial previsto no § 1º do mesmo art. 392: o início do afastamento será determinado por atestado médico oficial.


Uma vez que a Constituição Federal garante a conservação do emprego durante o repouso da gestante, e porque a CLT assegura o direito à licença remunerada sem distinção entre os diversos tipos de trabalho (art. 392), tanto em se tratando de contrato por prazo determinado como de contrato de experiência, continua o empregador obrigado a conceder a licença remunerada a que fizer jus a empregada gestante. Assim, desde que o termo estipulado para a extinção do contrato não ocorra antes de iniciado o período de afastamento compulsório da gestante, ser-lhe-á devida a licença remunerada.


Durante o afastamento, no período indicado (interrupção do contrato de trabalho), serão devidos à gestante os salários integrais que constitui o que se denomina salário-maternidade, calculado de acordo com a média dos seis últimos meses de trabalho se variáveis, sendo-lhe ainda facultado reverter à função que anteriormente ocupava (art. 393 da CLT).


Encerrando as disposições relativas à empregada gestante, a CLT estatui que em caso de aborto não criminoso, também comprovado por atestado médico oficial, a mulher terá um repouso remunerado de duas semanas a contar da data do acidente, com direito de retornar à função que ocupava antes de seu afastamento (art. 395).


Para finalizar cabe ressaltar que a Lei n. 9.020, de 13.04.95, considera ato discriminatório do trabalho da mulher a exigência, pelo empregador, de teste, exame, perícia, laudo, atestado, declaração ou outro qualquer meio destinado a esclarecer se está grávida ou esterilizada. O ato é punido com a pena de detenção de 1 a 2 anos, multa administrativa de 10 a 50 vezes o maior salário pago pelo empregador e a proibição de financiamentos em instituições oficiais. Prevê a lei a reintegração no emprego com o pagamento dos salários do período de afastamento em dobro, se houver dispensa discriminatória originária desses motivos.


Dra. Lucy Toledo das Dores Niess

Advogada Pós-graduada pela U.S.P., Auditora Fiscal do Trabalho em São Paulo aposentada e sócia do escritório Toledo Niess Advocacia e Consultoria Jurídica

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